segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Festival de Máscaras em Nimina

Saindo de Koin passamos por Toma para pegar nossas malas, sem ter muita certeza de que poderíamos voltar para casa ainda hoje, porque não sabíamos que horas as máscaras iam sair, só sabíamos que era de manhã e no final da tarde. Mas deu tudo certo!

Esse festival de máscaras acontece uma vez por ano, um ano é ano da mulher e dura 4 dias e o ano seguinte, é ano do homem e dura 3 dias. O número 4 simboliza a mulher por causa dos pequenos e grandes lábios vaginais e o número 3 representa o homem, dois testículos e o pênis. 2009 é o ano da mulher, então o festival dura 4 dias. As máscaras são feitas pelos escultores e durante o festival elas ficam na casa dos “portadores”, ambos são pessoas que tem esses papéis sociais na família. As máscaras são seres da floresta, tem a máscara mãe e as dos animais (hiena, elefante, búfalo, crocodilo, gazela, calao, cobra, etc) e elas vêm da floresta para o vilarejo, onde todos estão em círculo esperando para assistir a dança. Essa festa é então puramente animista, e embora muitos hoje sejam muçulmanos, protestantes ou católicos todos participam e se envolvem.

Chegamos então por volta das 16h30 em Nimina. Fidèle e Marília numa moto e nós dois na nossa. O vilarejo fica meio afastado e quando chegamos e paramos a moto, TODAS as crianças que estavam já em roda aguardando as máscaras chegarem, junto com o restante do povo, nos cercaram. Fomos então levados pelo Fidèle para conhecer o “chefe do vilarejo” e o “chefe dos costumes” sentados num tapete do outro lado da rua, separados do povo. Eles assistem à festa desse local, ficam ali sentados durante os 4 dias. Sentamos junto com eles e nos serviram o “dolô das máscaras”, feito especialmente para o festival.

Não esperamos muito e começou a correria, eram as máscaras chegando. Todos se organizaram em círculo para recebê-las. Elas vêm em fila e se sentam. Os músicos começam a cantar e o povo a bater palma, a primeira música é para a máscara mãe, para invocar os ancestrais. As máscaras respondem à invocação da música e vêm dançar. Depois da máscara mãe dançou o búfalo e depois a hiena. Essa primeira roda é rápida, é algo que vem aos poucos. São dias de preparação e depois de concentração até que todas elas se reúnem (podem chegar a 20). Depois de dançarem elas vão em direção ao monumento das máscaras que fica do outro lado da rua (do mesmo lado em que ficam os chefes), nesse momento as crianças saem correndo, desaparecem. As máscaras dançam ao redor do monumento e se despedem. Nessa última parte só participam as pessoas que organizam a festa, os ajudantes das máscaras e os músicos.

Foi rápido assim, mas é intenso. É uma energia boa e mística no ar...

Já estava anoitecendo quando acabou e mesmo não gostando muito da ideia de pegar a estrada, foi melhor ir para Dédougou do que voltar para Toma. A Marília então foi conosco para conhecer nosso canto, com a sua moto. Fidèle foi com o Eric e eu de carona no carro do Alphonse, que passou também para ver o festival. Sua mãe, Dona Josephine, é desse vilarejo e estava lá.

A viagem foi tranquila, só que o pneu do carro furou quase chegando em Dédougou. O Alphonse telefonou pedindo ajuda, mas Eric, Fidèle e Marília vinham atrás de moto e Eric e Fidèle entraram no vilarejo e pediram ajuda (por sorte paramos bem em frente de um) ... perdemos uns 40 min nessa mas chegamos todos bem, imundos, contentes e muito cansados!

Colocamos também um vídeo e fotos mostrando um pouco da festa!

Toma e Koin - uma missão

Como não podemos perder oportunidades, resolvemos esticar o final de semana e viajar para Toma. Nosso amigo Fidèle nos convidou para assistirmos o festival de máscaras de Nimina, que começaria na semana passada e foi adiado para este final de semana. Como Nimina é um pequeno vilarejo e fica muito perto de Toma (15 Km) nos hospedamos lá e convidamos a Marília pra ir com a gente. Mas dessa vez, aproveitando também que estaríamos por lá, fomos visitar um curandeiro, Jean Pierre, amigo do Fidéle, que mora em Koin (8 Km de Toma).

O plano era chegar na hora do almoço e visitá-lo à tarde e na segunda-feira ir para Nimina assistir o segundo dia de saídas das máscaras (que segundo dizem é o melhor dia) e de lá voltar para Dédougou; chegaríamos no início da tarde.

Fomos de ônibus de Ouaga para Toma, batizando a Marília nessa aventura. A viagem foi tranquila, triste foi que quase chegando, perto de um vilarejo, vimos uma criança sendo socorrida na beira da estrada, provavelmente morta atropelada.

Chegando em Toma nos damos conta, mais uma vez, que por aqui não adianta muito planejar o seu dia. Fidèle não estava, tinha ido num outro vilarejo para um funeral, mas seu filho Bernard nos acompanhou e depois de almoçar passeamos um pouco pela cidade. Dessa vez ficamos num hotel porque no dia anterior, sábado dia 28, teve o funeral anual, uma grande festa que reune os familiares daqueles que faleceram neste ano e a casa da família Ki-Zerbo, onde ficamos da outra vez, estava cheia. O Fidèle chegou no final da tarde, meio alegre de dolô, e fomos com a Marília na casa dessa mesma família (Ki-Zerbo) para tomar o dolô da Dona Josephine. Dessa vez estava conosco seu filho Alphonse, padre, que nos acolheu na sua casa na última vez.

Segunda-feira então retomamos o plano. Fomos cedo para a casa do Jean Pierre em Koin, que nos acolheu gentilmente e mandou preparar um frango pra gente. Bem, isso demorou, também tinham outras pessoas lá para serem atendidas. Ele trata as doenças com plantas medicinais e, por se tratar de um líder animista, não é só o aspecto físico que ele “vê”. Fomos primeiro nós dois e depois a Marília, sempre com o Fidèle traduzindo a conversa. Ele nos atende numa casinha cheia de fetiches e a conversa é bem tranquila, sentimos uma energia boa e a experiência foi legal... inesquecível. Depois que ele nos atendeu, almoçamos o de sorgô vermelho, molho de baobá e o frango que ele mandou preparar. Fomos embora, os três, com algumas missões para cumprir!

sábado, 28 de novembro de 2009

Aniversário da Ju com os elefantes

Aproveitamos que estávamos na capital para anteciparmos o final de semana, comemorar meu aniversário (dia 28) e curtir um pouquinho o lado turístico daqui antes de ir embora... falta pouco! Fomos para Nazinga com a Marília e a Marine (uma francesa de férias aqui, irmã do Jerôme que mora com a Marília e que trabalha com a Anne). Alugamos um 4X4 e saímos de Ouaga por volta das 13h em direção a Reserva de Nazinga. Esta reserva fica no sul de Burkina Faso, a cidade mais próxima se chama Pô a 145 Km de Ouaga. A reserva foi criada em 1979 por um canadense com o objetivo de proteger a fauna e manter o equilíbrio ecológico local, hoje é um espaço protegido também pelo governo burkinabês e muitos estudos são feitos na área. São 94.000 hectares em plena savana, a chamada Floresta de Nazinga, onde mais de 20.000 grandes mamíferos vivem livremente. Isso inclui todas as espécies presentes no país, com exceção dos leões que não estão mais nessa área.

Foi bem mais tranquilo viajar de carro ! Fomos curtindo a paisagem, que depois de Pô mudou um pouco, afinal estávamos entrando no “País dos Gourounsi”, etnia predominante local. Ainda na estrada principal entre Ouaga e Pô, Eric estava meio dormindo no carro e de repente viu pela janela “ih, um elefante”! Foi um susto!!!

Chegamos na entrada da reserva por volta das 17h, pagamos todas as taxas e iupiii! Mais 35 Km até chegar no acampamento! Pedimos o Djibril, nosso motorista, se poderíamos subir no teto para ver melhor a paisagem! Doeu o bumbum, mas adoramos! Logo nas primeiras horas vimos uma família de elefantes e pegamos um pôr-de-sol lindo! Eles desligam o gerador da reserva cedo (às 22h) e como não é muito aconselhável ficar perambulando à noite por causa das hienas, fomos dormir cedo. Fez muito frio mas o luar e silêncio da floresta nos embalou...

Acordamos às 6h, no dia 28, meu niver, empolgadíssimos para explorar a savana africana! O nascer-do-sol foi lindo, na beira do lago, tomando café da manhã, ouvindo os pássaros cantando e até um “bambi” que passou pulando! Subimos então no 4X4, nós 4 e o guia, no teto para não perder nada! O auge do passeio foi quando encontramos uma família de elefantes, bem perto da trilha por onde passamos. A mamãe ficou brava e veio botar a gente pra correr! O engraçado foi que o motorista ficou com mais medo do que a gente e correu mais do que precisava... foi muito legal (vejam o vídeo abaixo)!!!

Vimos então elefantes, famílias de elefantes... os bebês são fofos demais! Vimos famílias de “bambis” igual no desenho, malhadinhos; de alces e de javalis que para nós é o “pumba” (personagem do filme do Rei Leão). Também vimos diferentes espécies de antílopes: a palanca (Hippotragus), a palanca-vermelha (Hippotragus equinus), o cob-comum (Kobus kob) e o bauala ou gazela-pintada (Tragelaphus scriptus). Vimos um babuíno comendo tranquilamente numa árvore e muitos muitos pássaros diferentes e coloridos, um mais lindo do que o outro!
Foi show!

Tivemos que voltar para Ouaga no final da manhã porque Eric e Marília tinham compromisso, mas ficamos todos felizes com o nosso passeio! Passamos num maquis com a Anne, a Marine, o Jerôme e a Leila e no final da tarde assistimos uma peça de teatro no CCF. E, ainda, nosso amigo Jacques (agora aposentado mas que trabalha com o Eric na Fundação) chegou em Burkina Faso para uma semana de missão para um novo projeto... carinhosamente lembrou do meu aniversário e além de um presentinho nos deu um pedação de queijo comté!!! Fechando o dia, quase às 2h da manhã, mamãe, papai e Rapha cantaram parabéns e assopraram velhinha pra mim pelo Skype! Adorei e estou com vontade desse bolo até agora! Enfim, bem diferente esse meu dia!

... na véspera do nosso passeio, na quinta-feira à noite, a Claire, o Pierre e a Anne fizeram um bolinho para comemorarmos com direito a presente e tudo, pra mim e para o Eric atrasado! Umas graças!

Vejam a montagem que fizemos com os filminhos e as fotos!

domingo, 22 de novembro de 2009

Ouaga – Parte III

Partimos novamente para Ouaga. Mesmo esquema de sempre: sobe moto, sobe cabra, sobe cordeiro, sobe galão de plástico, sobe sacos, sobe malas, espera o ônibus “ficar pronto”... uma hora de atraso! Ok, ônibus lotado e vambora! O ônibus dessa vez estava reformado, pintadinho, com as janelas ok. Um tempo depois de viagem começa a gritaria “pára que o cordeiro quer descer!” O cordeiro estava com as patinhas caindo do teto do ônibus, esperneando! Pára tudo, arruma o bichinho e vambora! Mais pra frente novamente a gritaria “Hei! Tem gasolina escorrendo do teto!” E o povo correndo para fechar as janelas. Sim, alguém “transportou” gasolina em galão de plástico, não fechou bem, não devem ter avisado ao pessoal que “arruma” o ônibus... e dá nisso. Perigo! Mais pra frente novamente gritaria ““pára que a cabra quer descer!”. Pindurada, esperneando, coitadinha. Pára tudo, arruma o bichinho e vambora! Mais pra frente, levo um susto com o Eric vindo pra cima de mim fechando a janela, era ainda a gasolina, dessa vez escorrendo pela minha janela. Levei umas gotinhas que me perfumaram o resto do dia! E... nisso tudo lá se vai o aspecto “novinho” do ônibus. A estrada estava péssima e dessa vez batemos o recorde: O I T O H O R A S de viagem (só pra lembrar: são 230 Km)!

Quando chegamos em Ouaga só deu para pensar em tomar banho, comer e dormir... meio calados. Mas deu tempo de matar a saudade de uma pizza! Dessa vez temos muita coisa pra fazer em Ouaga. Nós dois viemos, principalmente, para participar de eventos. Eric foi no Fórum TIC Agricultura e eu nas Jornadas Científicas Res@tice 2009 ... que felizmente calharam nas mesmas datas! Para ambos foi muito legal ter participado. No Res@tice tinham participantes de 20 países (Burkina Faso, França, Canadá, Bélgica, Egito, Marrocos, Camarões, Tunísia, Arábia Saudita, etc) e eu era a única da América Latina. Foi legal principalmente para conhecer o que está sendo discutido nesses países e constatar que, guardada as devidas proporções, os desafios são os mesmos: vontade política, capacitação e formação de pessoal. O Fórum TIC Agricultura reuniu da região vindos não só de Burkina Faso mas também do Mali, da Costa do Marfim e do Gana.

Também aproveitamos para visitar a Cour aux 100 métiers da ATD Quarto Mundo aqui no Burkina Faso... adoramos! Nossas amigas Cíntia e Mariana, voluntárias permanentes, nos ajudaram a entrar em contato com o pessoal daqui e tivemos um encontro muito interessante.

Também reencontramos a Claire, amiga do Pierre e da Anne que estava no finalzinho das suas férias por aqui e, numa das nossas passagens pelo trabalho da Anne (CCF), reencontramos os brasileiros que conhecemos da outra vez, a Marília e o Daniel que dessa vez estava com a sua namorada. Ela se chama Leila e apesar de ser belga, é mais brasileira que outra coisa! Ai que saudade!

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Aniversário do Mardoché

Às 7h30 da manhã telefona um senhor do mercado que ficou de arrumar mandioca pra gente. Tínhamos pedido pouco, mas veio muito. Pensamos então que seria uma boa tentar fazer bolinhos de aipim... "mas com o quê dentro? Hum... queijo! O queijo das freiras!" As freiras que fazem o queijo moram a uns 5 Km de Dédougou... tudo por um queijo!

Passamos na casa da Francine e o nosso amigo Mardoché (filho do meio) estava emburrado porque não ia ter nada para comemorar o aniversário dele. Só que o Pierre já tinha combinado que eles iriam na nossa casa no final da tarde. Enquanto isso nós fomos atrás do queijo!

Chegamos em casa e fomos direto começar os preparativos e o Mardoché ajudou a gente a fazer os bolinhos! Como na casa dele não tem cozinha, tudo é legal, ele mexe em tudo e temos que ficar muito atentos, tínhamos que arrumar algo pra ele fazer logo:



Bem, nosso bolinho ficou muito bom! Delicioso! Adoramos! Ficamos suspirando quando experimentamos os primeiros e, como uma dupla que faz um ponto, vibramos: A B A L O U nosso bolinho! Falamos com tanta entonação que o Mardoché repetiu igualzinho: abalou! Rimos muito!!!

Foi um sábado “agitado” depois dos dias que passei de molho com o pé pra cima! Apesar de ter recebido várias visitas :) já estava cansada!

sábado, 14 de novembro de 2009

Hipopótamos!

Ai ai, que dia! Que dias! Ficamos 3 dias sem conexão para a internet e em alguns momentos até sem sinal de celular. Eric continua saindo bastante e trabalhando bastante. Eu estou trabalhando na medida do possível, pois dependo mais da internet, e tentando fazer outras coisas que depois conto!!

Bem, uma amiga do Pierre, Claire, chegou em Dédougou para passar uns dias e nesta quinta-feira ela combinou com o Youl dele ser o “guia” e levá-la em Lery (50 Km de Dédougou) para ver os hipopótamos. Ela perguntou se a gente não queria ir junto e meio indecisisos resolvemos ir. Eu não poderia mesmo fazer muita coisa pois na quinta não tinha voltado a conexão. Eric não tinha visitas agendadas, tinha que escrever, mas como ainda não tínhamos ido ver os bichinhos por causa das chuvas (o caminho é IMPOSSÍVEL) e já já vamos embora... fomos.

Lery é o local mais perto para ver os hipopótamos e onde tem o “Safari Express” – local onde os tubabus com dinheiro se hospedam para caçar. Lery fica perto da barragem do rio Mouhoun, alguns trechos são realmente lindos. No dia anterior, quando a Claire estava combinando com o Youl, tínhamos entendido que esse lugar (uma espécie de hotel), estaria aberto e que poderíamos inclusive curtir uma piscina, uma água gelada... até poder ver os “hipô”, que é sempre no final da tarde. Acontece que chegando lá, nos damos conta de que o local estava completamente abandonado! Tem um senhor que mora lá como caseiro e campo, só. Youl nos levou até o vilarejo mesmo, pertinho dali. Estava mesmo quente e ficamos umas 2 horas sentados, na sombra, dentro da cour de um amigo dele. Tinha umas 30 crianças paradas olhando pra gente, brincamos um pouco (ninguém falava francês) e voltamos para o local abandonado para fazer hora até às 16h, horário em que normalmente os hipopótamos começam a aparecer. Tentamos fazer um passeio de canoa pelo rio, mas segundo o Youl “tem muito hipô, pode ser perigoso”. Esperamos então.

Sinceramente nós dois ficamos frustrados e nos sentindo meio bobos de estar ali (como se já não bastassem todas as coisas que estão acontecendo). Finalmente, poderíamos ter saído mais tarde de Dédougou, já que tem “hora marcada” para ver os bichinhos e não seria tão cansativo, não tinha mais NADA para fazer lá e não tínhamos onde ficar, estava quente e mesmo na sombra não estávamos numa situação muito confortável. Melhor, entre as “deixas” que captamos, pareceu que a surpresa de encontrar tudo fechado, abandonado, foi só nossa.

Ok, lentamente mas às 16h chegou! Fomos então para a beira do rio ansiosos para ver os hipopótamos! Esse momento valeu à pena, cenário do Rei Leão:
entardecer, céu azul para rosa, muitos pássaros e ruídos da floresta, campo de algodão, rio calmo... água dourando com o pôr-do-sol. Silêncio. Os hipopótamos começam a fazer barulho, e aos pouquinhos começamos a ver as orelhinhas saindo da água e o chafariz que eles fazem para respirar, como as baleias.
Não deu para contar quantos tinham, uns 10 talvez. Infelizmente nenhum saiu da água de corpo inteiro, mas já foi lindo!

Pegamos então a estrada de volta para Dédougou, estrada não, trilha. E num dos trechos de areia, tivemos uma leve queda com a moto. Felizmente estávamos devagar e protegidos (calça, tênis, capacete), Eric só ralou a perna e eu machuquei o pé... tive uma luxação e agora estou com o pé pra cima! Nada grave!

Concluindo o dia, enquanto a gente estava fazendo o Raio-X do meu pé no hospital, nos parece que o Youl aproveitou a nossa ausência e cobrou da Claire um preço bem caro, 20 mil Francos, pelo serviço de guia turístico (?) ... o que também não gostamos muito, afinal ela não conhece muito o esquema.
... comemoramos assim nossos 5 meses de casados (no civil :p)

terça-feira, 10 de novembro de 2009

A esposa em kari

É muito legal ver a importância que as pessoas aqui dão em conhecer alguém da família de um amigo. Os agricultores com quem o Eric trabalha mudam de semblante quando ele me apresenta: “Juliana, minha esposa”. É engraçado porque como somos recém-casados não nos acostumamos ainda, muito menos com o “peso” social que isso representa (em nenhum lugar!). Bem, sendo assim, os agricultores sempre me convidam para conhecer a casa deles, me mandam presentes, etc... O Fidèle, nosso “tutor”, me chama de “a metade”. E eles ficam muito contentes quando eu “apareço”.

Na semana passada o Ouagadougou veio aqui em Dédougou, ele é um dos agricultores com quem o Eric está trabalhando. Ele me convidou para conhecer o seu “coin” (= canto, vilarejo) no dia do mercado, que aliás é difícil guardar na cabeça quando é, pois é a cada 5 dias corridos, por exemplo: se tem mercado numa segunda-feira, o próximo será no sábado e depois na quinta e assim vai. Fomos então nessa última terça-feira para Kari, o “coin” do Ouagadougou. Kari não é longe, fica a 20 Km de Dédougou e a estrada é asfaltada.

Chegando em Kari fomos recebidos por uns 3 Kg de amendoim, de presente! Amendoim do campo dele que a Marie Justine (esposa) preparrou pra gente. Ouagadougou tinha feito um programa: conhecer o seu campo, fazer um tour no vilarejo, ir no mercado e almoçar em casa. Partimos então para o campo. Atualmente os campos estão cheinhos de algodão! Está lindo! Ele mostrou como colher o algodão e estamos escalados para a colheita! O pouquinho de tudo que colhi hoje está guardado! Paramos em não sei quantos cabarés para beber (nome dado para as cours que fazem o dolô). O povo bebe muito dolô (principalmente em dia de mercado) a gente não acompanha! O mercado é legal, agitado! Comprei um tecido típico daqui bonito e provamos o benhê num formato diferente (tipo nossos bolinhos de chuva, mais massudos).

Mas a melhor cena foi voltando para casa... o Oauagadougou é muito engraçado! Andar com ele é divertido... na cour dele tinha uma “tubabu” antropóloga entrevistando dois caras, ela usava um gravador, bloco de notas, etc. Sentamos então e a esposa dele me chamou, ela estava me esperando para me mostrar como fazer o molho do baobá (nosso almoço). Então ficamos num canto e a Marie (a pesquisadora) estava num outro canto trabalhando. Num intervalo ela veio falar com a gente, foi simpática, nos contou o que está fazendo, etc. Mas sinceramente ela tem um ar de “vim aqui fazer um favor”. Bom, eis que chega o próximo entrevistado com a “cara cheia de dolô”. Ela se sentou e começou a conversar e a gravar... e o cara estava completamente bêbado!! ... Duro! Mas a cena foi divertida. No final ela “reclamou” com o Ouagadougou que nem esquentou a cabeça, tranquilão, “é, ele bebou um pouco”. Sabemos que ela mora em outro vilarejo, mas não entendemos se ele recebe ela lá para trabalhar e porque ela “reclamou” com ele, mas que foi engraçado foi!

Voltando para o almoço, (Marina essa é pra você!): a Justine fez passo a passo do molho de baobá para eu ver. Ela sabia que eu queria saber detalhes da receita para passar para a Marina e fez questão de me esperar. Difícil vai ser fazer fora do Burkina porque os ingredientes imagino que não podemos encontrar em outro lugar. Marina, vamos levar o restante dos ingredientes para você, é que achamos que era apenas a folha do baobá... pelo menos já levamos moído né?

Bem, missão cumprida, todos contentes e rumo de casa!

domingo, 8 de novembro de 2009

Zaba

O que vamos contar aqui vai ficar incompleto porque a missão dessa "viagem" ainda é segredo, vocês vão ficar sabendo mais tarde!

Hoje nosso amigo Fidèle nos levou em Zaba, à 50 Km (+ ou -) de Dédougou. Fomos e voltamos de manhã mesmo. Sair com o Fidèle sempre tem novidade! Para começar, chegamos às 7h30 na casa dele e saímos por volta das 10h! Ele primeiro liga para uma das filhas dele para pedir a moto emprestada, ela chega um tempo depois e como não sabia que era para pegar estrada, disse que não dava. Então o Fidèle insistiu que precisava de uma moto e sugeriu que fosse com a moto do namorado dela. Vão buscar a moto, depois vamos encher o tanque. Enfim, nenhuma pressa mesmo. Mas o que ficou claro pra gente é o seguinte: o "velho" manda, é mais ou menos "preciso e é agora" e os filhos ou os mais novos que se viram!!! Até o tom de voz muda quando é feita a "solicitação". Um exemplo rápido: quando estávamos saindo, ele volta em casa para perguntar com qual combustível tem que encher o tanque da moto. Estávamos ainda perto da casa dele e ele avisa "vou voltar para perguntar e encontro vocês no posto". E nós: "Te esperamos aqui mesmo, é melhor !?" Ele responde Ok e depois liga para o celular perguntando onde a gente estava porque ele estava no posto. Ai ai esse Fidèle!

Ok... voltando de Zaba (suspense!) a gente parou em Soakui (fica mesmo perto de Dédougou) para o Eric agendar uma visita com o Felix. Felix é um agricultor com quem o Eric vai começar a trabalhar, muito amigo do Fidèle. Ele estava em Apirikui, outro vilarejo que fica do outro lado da rua, bebendo o dolô "folclórico de domingo"! Ele foi encontrar a gente na casa dele mas depois nos convidou para beber um dolô também.

A cena é típica: embaixo de uma grande árvore, sentados em troncos com baldes e cabaças em volta. Conversa vai, conversa vem... e um senhor que estava na roda relembra de um funeral que Fidèle e Felix estavam... mais de 10 anos... tocando e dançando. Então comentei que pra gente não é comum ouvir música, muito menos "fazer batucada" num dia de funeral e nem pensar em dança! E Felix diz:
"Ah,mas pra gente, depois dos 70 anos, se não tiver dança e música no funeral de alguém, é como se essa pessoa não tivesse vivido, não tivesse feito nada na vida, não tivesse tido progenitores..."
Eles disseram que quando uma criança ou um jovem morre é diferente, não se faz nada porque ai sim é doloroso, "a pessoa não chegou a viver uma vida".

Outra coisa legal é tirar foto... vejam no álbum!

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Recebendo visitas francesas

Os pais da Anne e do Pierre tiraram férias e vieram conhecer o Burkina. Hoje eles chegaram aqui em Dédougou. Foi muito legal recebê-los em casa e conversar com "gente de fora" aqui, in loco!

Eles vão embora amanhã de manhã para Ouagadougou. Então hoje almoçaram na Francine (que ficou toda boba com as visitas), passearam pela cidade, foram no mercado, no trabalho do Pierre e aproveitaram a tranquilidade de Dédougou para descansar à tarde.

O Pierre encomendou um peixe na brasa para a janta e convidamos também o Fidèle e o Armand para comerem conosco. Isso foi de propósito. Bem, o Fidèle na verdade foi porque ele é alguém que, havendo ocasião, tem mesmo que conhecer. Ele chega, toma o seu "posto" e se torna o centro da conversa, conta histórias e levanta assuntos polêmicos...

O Armand sim foi mais proposital. O Armand é o responsável pelo projeto Vacances Loisirs, se lembram? Ele também é o coordenador da Compagnie Théatrale de la Solidarité (Companhia Teatral da Solidariedade). Ele e a trupe acabaram de fazer um tour pela região apresentando uma peça sobre a responsabilidade civil de pagar os impostos, encomendado pelo governo e estão preparando outra sobre o palu (o que é muito bom!). Ele gosta muito do que faz e sempre está correndo atrás para continuar seus projetos, de alguma forma. O Pierre queria que o Armand conhecesse o pai da Anne, Patrice, que trabalha numa associação para a promoção do teatro francófano que fez bastante festivais (por exemplo) aqui na África do Oeste e em outros países.

Conversamos bastante, de tudo um pouco, sobre as impressões deles dessa viagem, etc. mas também falamos de projetos e ter reunido o Fidèle, o Armand e o Patrice foi legal, saíram algumas ideias para futuros projetos e ficamos todos bem contentes com esse encontro! Agora vamos ver no que vai dar!

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Festa da colheita em Konkuykoro

Depois da época das chuvas começam as colheitas e as festas para agradecer o alimento desse ano. Todos os vilarejos fazem essa festa, pensávamos que era um acontecimeto social, mas finalmente essas festas são feitas nas igrejas, cada uma na sua maneira, mas o ritual deve ser bem parecido (acho). No outro domingo perdemos a de Toma, nosso amigo Fidèle tinha nos convidado mas nas vésperas da viagem uma pessoa da família dele faleceu em Bobo-Dioulasso e então ele teve que ir para cumprir o papel dele (lembram que na etnia dele ele prepara o corpo para o funeral?).

Desde que voltamos Eric tem saído bastante para trabalhar com os agricultores da região (aliás, assim que der ele vai contar aqui as últimas novidades) e um deles, Charles, nos convidou para voltar no vilarejo nesse domingo para participarmos da festa da colheita (foi na casa dele que o Eric dormiu no final de setembro, quando a chuva veio e ele não pôde voltar para a casa). Não foi normal, mas sábado choveu bastante e parou às 8h da manhã de domingo. Nessa altura já tínhamos desistido de ir, mas o Charles ligou e insistiu para pegarmos estrada. Ele disse que mesmo que a gente chegasse lá mais tarde era para ir! Saímos então de Dédougou quase às 9h, de moto. Konkuykoro fica a 90 km, não tem asfalto, não tem luz, não tem água corrente... é um vilarejo cheio de baobás, limpo, com quase 2 mil habitantes. A viagem foi longa pois em quase todo o trajeto a estrada estava mais ou menos assim:

Chegamos meio-dia em ponto na casa do Charles, que nos recebeu muito contente, de toalha enrolada na cintura! Foram tantas informações num único dia! Primeiro ele nos convida para entrar e descansar nessas cadeiras deliciosas que eles têm por aqui, ao lado de um monte de feijão que ele tinha colhido:

e abre uma melancia suculenta! Entramos no período das melancias e essa foi a primeira do dia! O papo começa enquanto o amigo dele nos prepara um chá! Charles já um senhor, um agricultor de “médio porte” bastante experiente, já foi para o Canadá, etc. Um homem simples, tranquilo e adorável!!! Andamos pelo vilarejo com o Charles e ele foi nos apresentando quem parava para nos cumprimentar. Quando chegamos a igreja já estava lotada, mas o Charles levou a gente para o primeiro banco. A missa foi muito animada e longa, toda em língua local (o Charles traduziu alguns trechos) e mais uma vez só tinha a gente de tubabu! E as crianças!? teve uma hora que tinham umas 30 na nossa frente, admiradas, rindo e se encondendo (de costas para o altar) até que alguém veio chamar a atenção delas e levá-las de “volta para o lugar”! A dança que eles fazem é diferente das que tínhamos visto até agora, mas os instrumentos são os mesmos. Mais para o final da missa, entram homens e mulheres com as oferendas a serem agradecidas, cada um com alguma coisa na mão: abóbora, melancia, tomate, cebola, arroz, milho, pequeno-milho (tradução literal), sorgo, gergelim, frango, cabrito, um bebê... eles fazem uma roda, cantando e dançando, e vão levantando e agradecendo tudo. Sim, jogam a criança e o cabrito pra cima!

Quando a missa acabou um senhor veio dizer ao Charles que eles nos ofereciam comida; mas ficamos sem saber os detalhes. Voltamos para a casa do Charles, ele abriu mais uma melancia (2ª do dia) e a esposa dele trouxe o almoço: arroz com molho de amendoim e carne de cabra e o deguê – hum, como explicar? Uma espécie de cereal que eles fazem uma “papa”, é gostosinho - mais a panela oferecida pela igreja. A ideia então era participarmos da festa e depois voltarmos para casa, mas a missa não acabou a tempo da gente chegar em Dédougou ainda de dia e então resolvemos passar a noite lá, o que deixou o Charles contente!

Eu tinha perguntado ao Charles se em Konkuykoro tinha escola e a resposta dele foi “você quer ir lá ver?” ... saímos então da casa dele e fomos passear, agora sem pressa. Em todas as cours um grupinho de pessoas sentadas conversando, todas nos saludando. Paramos para falar com um grupo de homens que estava ao lado de uma montanha de melancias, no pé de um enorme baobá... e o sol se pondo deixou essa cena especialmente bonita. Fomos até a escola e até a casa do diretor, que muito gentilmente abriu uma melancia pra gente (3ª do dia); ele me disse que lá eles têm uns 300 alunos e 6 professores! Voltando da casa do diretor, passamos em mais 3 amigos. Um deles, Gabriel, nos deu um saco de ovos de galinha d'angola e fez um monte de perguntas sobre o Brasil! Na casa dele jantamos (arroz com molho de amendoim e carne) e numa outra comemos o degê de novo. Notei que o Charles também não recusa nada do que nos oferecem, “é um dia de festa e nos dias de festas, comemos juntos, como os que são amigos fazem”, disse ele. Aqui é assim, aqueles que dividem um prato, são amigos; se te dão o que comer, é porque te consideram como um amigo. E, voltamos para a casa do Charles para descansar e jantar (mesmo prato e a 4ª melancia do dia). O filho dele mais velho nos trouxe um frango de presente e preparou o chá da tarde.

Quando era noite já, saímos para a dança. Charles emprestou uma roupa típica para o Eric! Antes de ir para a festa o Charles também veio com um super blusão para mim, ele disse que com o meu casaco eu ia sentir frio! Foi a primeira vez que sentimos um pouco de frio, estava mesmo fresquinho. Observação: desde o início ele estava preocupado com a calça jeans do Eric! Essa calça tem um rasgo no joelho esquerdo (e eu brigo com ele para não usar mais), mas como ficamos imundos depois de pegar a estrada... ele foi com ela. Quando chegamos o Charles notou e perguntou o que tinha acontecido, se tinha sido na viagem e perguntou se o Eric queria se trocar. Eu quase me enfiei dentro do monte de feijão! Eric respondeu que tudo bem e perguntou se havia problema ele ir na missa assim. Charles, logicamente, disse que não havia problema nenhum, mas estranhou! Acontece isso, nós evitamos de usar roupas “boas” aqui, mas eles são vaidosos com as “roupas sociais”, principalmente em dia de festa. Né, seu Eric!? A noite foi linda! Pegamos uma lua cheia linda que iluminava todo o caminho! Tudo! Nem era preciso lanterna onde não tem eletricidade! Ficamos maravilhados!! Fomos para a roda de dança, conversamos mais um pouco com o Timothée (amigo do Charles, também muito gente boa), dançamos um pouquinho e voltamos para a casa quase 1h da manhã! A lua ainda estava lá, iluminando tudo...

A esposa do Charles já tinha arrumado a nossa cama... dormimos super bem na roça! Pena que durou somente 4 horinhas porque levantamos cedo para pegar estrada novamente! Quando acordamos, ainda estavam dançando. No café da manhã a nossa 5ª melancia (e não pode pegar só um pedaço), o deguê e o chá. Nós ficamos contentes com esse dia, com a forma com que fomos acolhidos e mais uma vez mexidos com o que não sabemos bem explicar. Eu, particularmente, fiquei emocionada de ter estado ali, num vilarejo no interior do interior da África, onde a vida é dura, simples e ninguém reclama dela. Onde TODOS se cumprimentam e perguntam “como vai a família no Brasil?”. Onde falta tudo, mas todo mundo tem telefone celular.

O Charles, sentado à direita com a sua esposa, tem 7 filhos. Esses na foto são os mais novos, que ainda moram com ele. Uma filha e um filho já são casados e moram no mesmo vilarejo. O rapaz que não conhecemos mora no Mali e a outra filha mora em Nouna, uma cidade perto. A esposa dele não fala francês, mas nos despedindo Charles traduziu o que ela queria dizer: que ficou muito contente em nos receber na casa dela e que somos amigos. Ele levou a moto do Eric até a entrada da cour e disse “Que Deus projeta vocês na estrada e a família de vocês sempre!

Deixamos Konkuykoro - com um casal de frangos (um em cada guidão da moto), um saco de ovos, uma garrafa de deguê e uma melancia (grande) - dando tchau para todos os que apareciam no caminho sorrindo ou desejando boa viagem e... com lágrimas rolando!